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Casa Magnólia, um lugar para você encontrar.

 Quando chega Fevereiro passo os  dias a caçar magnólias. Não qualquer magnólia que se me apresente, atenção. Interessa-me unicamente a magnólia branca, mais invulgar, mais frágil, um erro genético. A magnólia rosa, cujo suave tom acetinado constitui o cenário ideal para fotos de casamento, aborrece-me.

Porque me fiz caçador de magnólias? A pergunta deveria ser: porque não o somos todos? Encontrá-las transformou-se numa missão da qual quase se poderia dizer que depende a sobrevivência da espécie. Da nossa espécie.

Localizo-as, tomo uns quantos apontamentos que poderão ser sobre a tonalidade, o perfume, ou o desenho particular que as pétalas mortas traçam sobre o solo, e caço-as. Como caço? Bem, creio que da mesma forma que todos os outros o fazem, mas, enfim, posso explicar. Coloco-me ao lado do tronco, sob a ramagem, aspiro o perfume sutilmente adocicado, olho o céu através dos ramos, depois afasto-me um pouco para contemplar o indivíduo na sua totalidade.

Não há luz alguma no mundo que se assemelhe à que irrompe das magnólias. Tão doce, tão pungente. A flor da magnólia branca é um poema. Um milagre a pairar sobre o asfalto. As magnólias acendem-se ao sol, amadurecem, e quanto mais ao sol se dão mais curta será a sua já tão curta vida.  Nada é tão fugaz quanto o esplendor das magnólias. Por isso necessitam dos seus caçadores, de quem atente ao triunfo do primeiro botão,  e escute o secreto rumor da sua seiva, e aguarde com constância o fim do Inverno para recebê-las.

Em poucos dias principiarão as pétalas a tombar, num voo cego em direcção ao solo, anunciando um novo ciclo de vida, oculto no obscuro coração da terra. Será então o momento de os caçadores recolherem. Mas agora é o tempo da caça e não posso esperar mais.

                                                                 

                                                                Carla Romualdo

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